|||tëstëstë||| | ||||||||||||||||||||
Vontade | ||||||||||||||||||||
Arthur Schopenhauer nasceu em 22 de fevereiro de 1788, em Dantzig, na Prússia, filho de um rico comerciante. A família abandonou Dantzig em 1793 quando esta cidade foi anexada à Polônia, instalando-se em Hamburgo. O pai suicidou-se, segundo parece, em 1805. A avó paterna tinha morrido enlouquecida. Sua mãe, Johanna Schopenhauer era culta e inteligente, tornando-se uma das novelistas mais apreciadas de seu tempo. Depois da morte do marido, estabeleceu-se em Weimar e passou a freqüentar os círculos mundanos. Schopenhauer não concordava com a conduta da mãe e as relações entre os dois deterioraram-se. Schopenhauer abandonou Weimar afirmando que, ela somente seria lembrada no futuro pelo fato de ser sua progenitora e não voltou a vê-la durante os vinte e quatro anos que ela ainda viveu. No tempo em que freqüentou o salão de sua mãe, tornou-se amigo de Goethe (1749-1832), o qual reconhecia seu gênio filosófico e o incentivou a desenvolver uma teoria antinewtonia da visão. Em decorrência, Schopenhauer escreveu "Sobre a Visão e as Cores", publicado em 1816. Aos 21 anos, ingressou na Universidade de Göttingen cursando incialmente medicina e transferiu-se depois para filosofia, concentrando-se em Platão e Immanuel Kant. Estudou também na Universidade de Berlim, mas defendeu seu doutorado na Universidade de Jena com a dissertação "Sobre a quádrupla raiz do princípio da razão suficiente". O Orientalista Friedrich Majer, um discípulo de Johann Gottfried Herder, introduziu Schopenhauer nos ensinamentos indus os quais tiveram profunda influência em seu pensamento. Ele passou a acreditar que juntamente com as filosofias de Platão e Kant, as doutrinas indianas constituiam o alicerce para construir uma sólida filosofia de representação. Consagrou todo o seu tempo à sua principal obra "O mundo como Vontade e como Representação", publicada em Leipzig, em 1818. Infelizmente não obteve o menor êxito, a maior parte da edição foi vendida 16 anos mais tarde, como papel velho. Quando em 1822 foi chamado a Berlim como professor, agendou suas aulas no mesmo horário de seu oponente Hegel (1770-1831). Mas Hegel dominava o espírito da mocidade, era o filósofo oficial da Alemanha e Schopenhauer viu sua sala vazia, renunciando à universidade. Em 1831, deixou Berlim, fixando-se em Frankfurt-sobre-o-Main, onde passou o resto da vida, dedicado exclusivamente à reflexão filosófica. Decididamente a vida não lhe permitia acalentar ilusões otimistas. Ali viveu os últimos 27 anos de sua vida, tendo apenas por companheiro um cão, o fiel Atma, que foi seu único dedicado amigo (O filósofo e seu cão. Caricatura de Wilhelm Busch). Sua predileção por animais era filosoficamente justificada; segundo Schopenhauer entre os cães, contrariamente ao que ocorre entre os homens, a vontade não é dissimulada pela máscara do pensamento. Passando toda a vida num ambiente árido de afetos, sem família, sem amigos, sem pátria, incompreendido, tornou-se irritável, misantropo e desconfiado. Schopenhauer trabalhou intensamente em Frankfurt, redigindo e publicando diversos livros. Em 1841 foi editado "Os dois problemas fundamentais da Ética" e em 1851 apareceram 2 volumes de ensaios sobre o título "Parerga e Paralipomena - literalmente "Acessórios e Remanescentes". De todas as suas obras, esta alcançou inesperado sucesso e foi a que mais contribuiu para a disseminação de sua filosofia. A partir daí, a notoriedade do autor espalhou-se pela Alemanha e depois para a Europa. Na Alemanha, a filosofia de Hegel entrou em declínio e Schopenhauer surgiu como ídolo das novas gerações. Schopenhauer conseguiu, nos últimos anos de sua vida o reconhecimento que sempre buscou. A Universidade de Breslau dedicou cursos à análise de sua obra e a Academia Real de Ciências de Berlim propôs-lhe o título de membro, em 1858, que ele recusou. Dois anos depois, a 21 de setembro de 1860, Arthur Schopenhauer faleceu aos 72 anos de idade, vítima de pneumonia. FILOSOFIA Arthur Schopenhauer é o filósofo da vontade. Ela é o único elemento permanente e invariável do espírito, aquele que lhe dá coerência e unidade, que constitui a essência do homem. A vontade seria o princípio fundamental da natureza, independente da representação, não se submetendo às leis da razão. Schopenhauer afirma que o real é em si mesmo cego e irracional, enquanto vontade. As formas racionais da consciência não passam de aparências e a essência de todas as coisas seria alheia à razão: "A consciência é a mera superfície de nossa mente, da qual, como da terra, não conhecemos o interior, mas apenas a crosta". O inconsciente apresenta assim, um papel fundamental na filosofia de Schopenhauer. A vontade é, acima de tudo, uma vontade de viver e de viver na máxima plenitude. Ela triunfa da própria morte graças à estratégia da reprodução, que a torna imperecível. Por isso o instinto de reprodução é o mais forte de todos os instintos. A atração sexual é determinada por motivos estranhos ao indivíduo e tem em vista, apenas, assegurar a perpetuação da espécie, nas melhores condições possíveis. Desde que o mundo é essencialmente vontade, não pode deixar de ser um mundo de sofrimento. A vontade é um índice de necessidade, e como ela é imperecível, continua sempre insatisfeita. A aparente satisfação da vontade conduz ao tédio. A satisfação de um desejo é como a esmola que se dá ao mendigo, só consegue manter-lhe a vida para lhe prolongar a miséria. Por isso mesmo a vontade é um mal e a origem de todos os males. O conhecimento não nos permite triunfar do mal. Pelo contrário: desenvolve a capacidade de o sentir, aumentando a sensibilidade. O suicídio também não seria a solução, porque a vontade subsistiria sob outra forma, na espécie. A destruição voluntária de uma só existência é um ato inútil e estúpido porque a coisa em si - a espécie, a vida e a vontade em geral - não seria afetada. A solução do problema do mal está no aniquilamento da vontade, na renúncia total. Assim Schopenhauer se aproxima do ideal budista. OBRA Sobre a quádrupla raiz do princípio da razão suficiente (1813) Sobre a Visão e as Cores (1816) O mundo como Vontade e Representação (1819) Os dois problemas fundamentais da Ética (1841) Dores do Mundo (184?) A Sabedoria da Vida (184?) O mundo como Vontade e Representação (1844; 2d Edição) Parerga e Paralipomena (1851) ALGUMAS FRASES "Em geral, os sábios de todos os tempos têm dito sempre o mesmo, e os nécios, isto é, a imensa maioria de todos os tempos, têm também feito e dito sempre o mesmo, e continuará sempre sendo assim. Por isso dizia Voltaire: Nóus laisserons ce monde ci aussi sot et aussi mechant que nous l'avons trouvé en y arrivant." Extrato da introdução do ensaio "A Sabedoria da Vida". "Há muito tempo que sou da opinião que a soma do barulho que um homem pode suportar sem se incomodar está na razão inversa de sua inteligência e é uma boa medida desta..." "A modéstia é a humildade de um hipócrita que pede perdão por seus méritos aos que não têm nenhum." "O que um indivíduo pode ser para o outro, não significa grande coisa, no fim cada qual acaba só. Ser feliz, diz Aristóteles, é bastar-se a si mesmo." "Nada merece nosso esforço, todas as coisas boas são apenas vaidades, o mundo é uma bancarrota e a vida, um mau negócio, que não paga o investimento. Para ser feliz, é preciso ser como as crianças: ignorante." "O médico vê o homem em toda a sua fraqueza; o jurista o vê em toda a sua maldade; o teólogo, em toda a sua imbecilidade." | ||||||||||||||||||||
Coração | ||||||||||||||||||||
O PIPO DE «AMONTILLADO» por Edgar Allan Poe Suportei o melhor que pude as mil e uma injúrias de Fortunato; mas quando começou a entrar pelo insulto, jurei vingança. Vós, que tão bem conheceis a natureza da minha índole, não ireis supor que me limitei a ameaçar. Acabaria por vingar-me; isto era ponto definitivamente assente, e a própria determinação com que o decidi afastava toda e qualquer ideia de risco. Devia não só castigar, mas castigar ficando impune. Um agravo não é vingado quando a vingança surpreende o vingador. E fica igualmente por vingar quando o vingador não consegue fazer-se reconhecer como tal àquele que o ofendeu. Deve compreender-se que nem por palavras, nem por actos, dei motivos a Fortunato para duvidar da minha afeição. Continuei, como era meu desejo, a rir-me para ele, que não compreendia que o meu sorriso resultava agora da ideia da sua imolação. Tinha um ponto fraco, este Fortunato sendo embora, sob outros aspectos, homem digno de respeito e mesmo de receio. Orgulhava-se da sua qualidade de entendido em vinhos. Poucos italianos possuem o verdadeiro espírito de virtuosidade. Na sua maior parte, o seu entusiasmo é adaptado às circunstâncias de tempo e de oportunidade para ludibriar milionários britânicos e austríacos. Em pintura e pedras preciosas, Fortunato, à semelhança dos seus concidadãos, era um charlatão, mas na questão de vinhos era entendido. Neste aspecto eu não diferia substancialmente dele: eu próprio era entendido em vinhos de reserva italianos, e comprava-os em grandes quantidades sempre que podia. Foi ao escurecer, numa tarde de grande loucura da quadra carnavalesca, que encontrei o meu amigo. Acolheu-me com excessivo calor, pois bebera de mais. Trajava de bufão; um fato justo e parcialmente às tiras, levando na cabeça um barrete cónico com guizos. Fiquei tão contente de o ver que julguei que nunca mais parava de lhe apertar a mão. - Meu caro Fortunato - disse eu -, ainda bem que o encontro. Você tem hoje uma aparência notável! Saiba que recebi um pipo de um vinho que passa por ser amontillado; mas tenho cá as minhas dúvidas. - O quê? - disse ele - Amontillado? Um pipo? Impossível! E em pleno Carnaval! - Tenho as minhas dúvidas - respondi -, e estupidamente paguei o verdadeiro preço do amontillado sem ter consultado o meu amigo. Não o consegui encontrar e tinha receio de perder o negócio! - Amontillado! - Tenho as minhas dúvidas - insisti. - Amontillado! - E tenho de as resolver. - Amontillado! - Como vejo que está ocupado, vou procurar Luchesi. Se existe alguém com espírito crítico, é ele. Ele me dirá. - Luchesi não distingue amontillado de xerez. - No entanto, há muito idiota que acha que o seu gosto desafia o do meu amigo. - Venha, vamos lá. - Aonde? - À sua cave. - Não, meu amigo, não exigiria tanto da sua bondade. Vejo que tem compromissos. Luchesi... - Não tenho compromisso nenhum, vamos. - Não, meu amigo. Não será o compromisso, mas aquele frio terrível que bem sei que o aflige. A cave é insuportavelmente húmida. Está coberta de salitre. - Mesmo assim, vamos lá. O frio não é nada. Amontillado! Você foi ludibriado. E quanto a Luchesi, não distingue xerez de amontillado. Assim falando, Fortunato pegou-me pelo braço. Depois de pôr uma máscara de seda preta e de envergar um roquelaire cingido ao corpo, tive que suportar-lhe a pressa que levava a caminho do meu palacete. Não havia criados em casa; tinham desaparecido todos para festejar aquela quadra. Eu tinha-lhes dito que não voltaria senão de manhã e dera-lhes ordens explícitas para se não afastarem de casa. Ordens essas que foram o suficiente, disso estava eu certo, para assegurar o rápido desaparecimento de todos eles, mal voltara costas. Retirei das arandelas dois archotes e, dando um a Fortunato, conduzi-o através de diversos compartimentos até à entrada das caves. Desci uma grande escada de caracol e pedi-lhe que se acautelasse enquanto me seguia. Quando chegámos ao fim da descida encontrávamo-nos ambos sobre o chão húmido das catacumbas dos Montresors. O andar do meu amigo era irregular e os guizos da capa tilintavam quando se movia. - O pipo? - perguntou. - Está lá mais para diante - disse eu -, mas veja a teia branca de aranha que cintila nas paredes da cave. Voltou-se para mim e poisou nos meus olhos duas órbitas enevoadas pelos fumos da intoxicação. - Salitre? - perguntou por fim. - Sim - respondi. - Há quanto tempo tem essa tosse? - Hâg!, hâg!, hâg! Hâg!, hâg!, hâg! O meu amigo ficou sem poder responder-me durante bastante tempo. - Não é nada - acabou por dizer. - Venha - disse-lhe com decisão. - Retrocedamos, a sua saúde é preciosa. Você é rico, respeitado, admirado, amado; você é feliz como eu já o fui em tempos. Você é um homem cuja falta se sentiria. Quanto a mim, não importa. Retrocedamos. Ainda é capaz de adoecer e não quero assumir tal responsabilidade. Além disso, há Luchesi... - Basta! - replicou. - A tosse não é nada, não me vai matar. Não vou morrer por causa da tosse. - Pois decerto que não, pois decerto - respondi -; não é minha intenção alarmá-lo desnecessariamente, mas deve usar de cautela. Um gole deste médoc defender-nos-á da humidade. Quebrei o gargalo de uma garrafa que retirei de uma longa fila de muitas outras iguais que jaziam no bolor. - Beba - disse, apresentando-lhe o vinho. Levou-o aos lábios, olhando-me de soslaio. Fez uma pausa e abanou a cabeça significativamente, enquanto os guizos tilintavam. - Bebo - disse - aos mortos que repousam à nossa volta. - E eu para que você viva muito. Novamente me tomou pelo braço e prosseguimos. - Estas catacumbas são enormes - disse ele. - Os Montresors - respondi - constituíam uma família grande e numerosa. - Não me lembro do vosso brasão. - Um enorme pé humano, de ouro, em campo azul; o pé esmaga uma serpente rampante cujas presas estão ferradas no calcanhar. - E a divisa? - Nemo me impune lacessit(1) - Óptimo! - disse ele. O vinho brilhava no seu olhar e os guizos tilintavam. A minha própria disposição melhorara com o médoc. Tinha passado por entre paredes de ossos empilhados, à mistura com barris e pipos, nos mais recônditos escaninhos das catacumbas. Parei novamente e desta vez fiz questão de segurar Fortunato por um braço, acima do cotovelo. - Salitre! - disse eu -, veja como aumenta. Parece musgo nas abóbadas. Estamos sob o leito do rio. As gotas de humidade escorrem por entre os ossos. Venha, vamo-nos embora que já é muito tarde. A sua tosse... - Não faz mal - retorquiu -, continuaremos. Antes, porém, mais um trago de rnédoc. Abri e passei-lhe uma garrafa de De Grâve. Despejou-a de um trago. Os olhos brilharam-lhe com um fulgor feroz. Riu e atirou a garrafa ao ar, com uns gestos que não entendi. Olhei-o surpreso. Repetiu o movimento grotesco. - Não compreende? - Não, não compreendo - respondi. - Então não pertence à irmandade. - Como? - Quero eu dizer que não pertence à Maçonaria. - Sim, sim - disse -, sim, pertenço. - Você? Impossível! Um mação? - Sim, um mação - respondi. - Um sinal - disse ele. - Aqui o tem - retorqui, mostrando uma colher de pedreiro que retirei das dobras do meu roquelaire. - Está a brincar - exclamou, recuando alguns passos. - Mas vamos lá ao amontillado. - Assim seja - disse eu, tornando a colocar a ferramenta sob a capa e tornando a oferecer-lhe o meu braço. Apoiou-se nele pesadamente. Continuámos o nosso caminho em procura do amontillado. Passámos por uma série de arcos baixos, descemos, atravessámos outros, descemos novamente e chegámos a uma profunda cripta na qual a rarefacção do ar fazia com que os archotes reluzissem em vez de arderem em chama. No ponto mais afastado da cripta havia uma outra cripta menos espaçosa. As paredes tinham sido forradas com despojos humanos, empilhados até à abóbada, à maneira das grandes catacumbas de Paris. Três das paredes desta cripta interior estavam ainda ornamentadas desta maneira. Na quarta parede, os ossos tinham sido derrubados e jaziam promiscuamente no solo, formando num ponto um montículo de certo vulto. Nessa parede assim exposta pela remoção dos ossos, percebia-se um recesso ainda mais recôndito, com um metro e vinte centímetros de fundo, noventa centímetros de largo e um metro e oitenta a dois metros e dez de alto. Parecia não ter sido construído com qualquer fim específico, constituindo apenas o intervalo entre dois dos colossais suportes do tecto das catacumbas, e era limitado, ao fundo, por uma das paredes circundantes em granito sólido. Foi em vão que Fortunato, levantando o seu tíbio archote, tentou sondar a profundidade do recesso. A enfraquecida luz não nos permitia ver-lhe o fim. - Continue - disse eu -, o amontillado está aí dentro. Quanto a Luchesi... - É um ignorante - interrompeu o meu amigo, enquanto avançava, vacilante, seguido por mim. Num instante atingira o extremo do nicho, e vendo que não podia continuar por causa da rocha, ficou estupidamente desorientado. Um momento mais e tinha-o agrilhoado ao granito. Havia na parede dois grampos de ferro, distantes um do outro, na horizontal, cerca de sessenta centímetros. De um deles pendia uma pequena corrente e do outro um cadeado. Lançar-lhe a corrente em volta da cintura e fechá-la foi obra de poucos segundos. Ficara demasiado surpreendido para oferecer resistência. Retirei a chave e recuei. - Passe a mão pela parede - disse eu. - Não deixará de sentir o salitre. Na realidade está muito húmido. Mais uma vez lhe suplico que nos retiremos. Não lhe convém? Nesse caso, tenho realmente de o deixar. Mas, primeiro, quero prestar-lhe todas as pequenas atenções ao meu alcance. - O amontillado! - berrou o meu amigo, que se não recompusera ainda do espanto em que se encontrava. - É verdade - respondi. - O amontillado. Ao dizer isto, pus-me a procurar com todo o afã por entre as pilhas de ossos de que já falei. Atirando com eles para o lado, pus a descoberto uma quantidade de pedras e argamassa. Com estes materiais e com a ajuda da minha trolha, comecei a entaipar com todo o vigor a entrada do nicho. Mal tinha colocado a primeira fiada de pedras quando descobri que a embriaguez de Fortunato tinha em grande parte desaparecido. A este respeito, o primeiro indício foi-me dado por um longo gemido vindo da profundidade do recesso. Não era o gemido de um ébrio. Sucedeu-se um prolongado e obstinado silêncio. Pus a segunda fiada de pedras, a terceira e a quarta. Em seguida ouvi as vibrações furiosas da corrente. O ruído prolongou-se por alguns minutos, durante os quais, para me ser possível ouvi-lo com maior satisfação, suspendi a minha tarefa e sentei-me no montículo de ossos. Quando finalmente cessou o tilintar, retomei a trolha e completei sem interrupção a quinta, a sexta e a sétima fiadas. A parede estava agora quase ao nível do meu peito. Parei novamente e, elevando o archote acima do parapeito, fiz incidir alguns raios de luz sobre a figura que lá estava dentro. Uma sucessão de gritos altos e agudos, irrompendo de súbito da garganta da figura agrilhoada, quase me atirou violentamente para trás. Por um breve momento hesitei, tremi. Desembainhei o florete e com ele comecei a tactear o recesso, mas bastou pensar um momento para voltar a sentir-me seguro. Coloquei a mão sobre a sólida construção das catacumbas e fiquei satisfeito. Tornei a aproximar-me da parede. Respondi aos gritos daquele que clamava. Repeti-os como um eco, juntei-me a eles, ultrapassei-os em volume e força. Depois disto, o outro sossegou. Era agora meia-noite e a minha tarefa aproximava-se do fim. Completara já a oitava, a nona e a décima fiadas. Tinha acabado uma porção da décima primeira e última; faltava apenas colocar e fixar uma pequena pedra. Lutava com o seu peso; coloquei-a parcialmente na posição que lhe cabia. Soltou-se então do nicho um riso abafado que me arrepiou os cabelos. Seguiu-se uma voz triste que tive dificuldade em reconhecer como sendo a do nobre Fortunato. Dizia aquela voz: - Ah!, ah!, ah!, eh!, eh!, boa piada, de facto, excelente gracejo. Havemos de rir bastante acerca disto, lá no palácio, eh!, eh!, eh!, acerca do nosso vinho, eh!, eh!, eh! - O amontillado? - disse eu. - Eh!, eh!, eh!, eh!, eh!, eh!, sim, o amontillado. Mas não estará a fazer-se tarde? Não estarão à nossa espera no palácio lady Fortunato e os convidados? Vamo-nos embora. - Sim - disse eu -, vamo-nos. - Pelo amor de Deus, Montresor! - Sim - disse eu -, pelo amor de Deus! Em vão esperei uma resposta a estas palavras. Comecei a ficar impaciente. Chamei em voz alta: - Fortunato! Não obtive resposta. Chamei novamente: - Fortunato! Continuei sem resposta. Meti um archote pela pequena abertura e deixei-o cair lá dentro. Em resposta ouvi apenas um tilintar de guizos. Senti o coração oprimido, dada a forte humidade das catacumbas. Apressei-me a pôr fim à minha tarefa. Forcei a última pedra no buraco, e fixei-a com a argamassa. De encontro a esta nova parede tornei a colocar a velha muralha de ossos. Durante meio século nenhum mortal os perturbou. In pace requiescat!(2) Notas: 1 Ninguém me fere impunemente. 2 Descanse em paz! | ||||||||||||||||||||
Solução | ||||||||||||||||||||
A Luz das Estrelas e a Idade do Universo Richard Niessen O problema A luz que transpõe 300.000 km/s, viaja trilhões do kmlano. A distância assim percorrida é chamada de um ano-luz. Existem galáxias que estão, segundo se alega. a bilhões de anos-luz distantes do nós no espaço. Isso significa que a luz que saiu das galáxias há 5 bilhões de anos, estaria agora nos alcançando. Isso pareceria indicar que o universo e a criação devem ter pelo menos, 5 bilhões de anos ou então não estaríamos vendo essa luz. Em outras palavras, se as estrelas tivessem apenas de 6 a 10.000 anos de idade, a luz dessas distantes galáxias ainda não nos teria alcançado. Quatro possíveis soluções 1) As distâncias espaciais não podem ser medidas de maneira exata. Obviamente não podemos estender um barbante no espaço cósmico ou medir tais distâncias com uma fita métrica, por isso as distâncias são calculadas e não medidas. Isso se faz através de uma técnica conhecida como triangulação, ou paralaxe. Topógrafos usam esse método com as leis da trigonometria que afirmam que, se a linha de base e dois ângulos de um triângulo são conhecidos, então a altura desse triângulo pode ser calculada. Distâncias curtas de algumas poucas centenas de milhares de quilômetros podem ser medidas pala triangulação de observações simultâneas de observatórios em lados opostos da terra, mas, quando a proporção das distâncias entre o conhecido e o desconhecido aumentam, os ângulos da linha da base se tornam cada vez maiores de modo que além de uma proporção de 28,5 para 1 entre a altitude e a linha de base, o ângulo se torna maior que 89º e deve ser subdividido em minutos e segundos do arco. As limitações deste método são evidentes, até mesmo dentro do nosso próprio sistema solar, pois o ângulo vértice até o sol teria apenas 10 segundos do arco (1/360 de um grau). As distâncias até mesmo às estrelas mais próximas são tão grandes que se torna necessário uma linha de base triangulacional maior, de modo que se usa a órbita da terra ao redor do sol, permitindo uma linha de base de cerca de 300 milhões de quilômetros. As observações são feitas com seis meses de intervalo, os ângulos são comparados e a distância é computada com a trigonometria. Considerando que as distâncias entre as estrelas são tão grandes, os lados do triângulo são praticamente perpendiculares e assim apenas as distancias até as estrelas mais próximas (até cerca de 200 anos-luz) podem ser medidas através desta técnica. Por exemplo, o nossa sol dista 8 minutos-luz de nós, portanto a linha de base do triângulo teria 16 minutos-luz. Mas a estrela mais próxima, Alfa Centauro, fica a 4 1/2 anos-luz ou 2.365.000 minutos-luz da terra, numa proporção aproximada de 148.000 para 1. Nessa proporção, uma linha do 215 mm, traçada numa página. A4 teria o vértice do seu ângulo a 322 km do distância! Distâncias maiores são determinadas pelos tamanhos presumidos e pela intensidade das estrelas, pelo desvio para o vermelho e muitos fatores questionáveis que talvez não tenham nada a ver com a distância.1 Na verdade, alguns astrônomos acham que é possível que todo o universo possa ser encaixado em uma área de 200 anos luz de raio a partir da terra! Portanto não temos nenhuma garantia de que as distâncias reais no espaço sejam tão grandes como as que têm sido divulgadas, e a luz vinda do ponto mais distante no universo, tenha nos alcançado em apenas algumas centenas de anos. 2) A luz pode tomar um "atalho" em sua viagem através do espaço. Isto é difícil de ilustrar mas basta dizer que há dois conceitos sobre a "forma" do espaço cósmico. Um diz que ele é em linha reta (Euclideano), e o outro, que ele é curvo (Riemanniano). Com base em observações de 27 sistemas binários de estrelas, parece que a luz no espaço profundo viaja em linhas curvas sobre superfícies riemannianas. 2 A fórmula para converter o espaço reto em curvo é S = 2R tan -1 (r/2R), onde r é a distância euclideana ou em linha reta, e R é o raio da curvatura do espaço riemanniano. Com esta fórmula, a um raio de curvatura de 5 anos-luz para o espaço riemanniano, o tempo que a luz leva para alcançar-nos de diversos pontos em nosso sistema solar é praticamente o mesmo, tanto nas distâncias euclideanas como nas riemannianas, e não há grande alteração, mesmo em relação à estrela mais próxima (41/2 anos-luz). Mas se nós inserirmos uma distância euclideana infinita para a estrela mais distante que possamos conceber, levaria apenas 15,71 anos para a luz chegar até nós vinda dessa distância. O quadro abaixo nos dá uma idéia da conversão distância-tempo: Distância Euclideana, em anos Luz Distância Riemanneana em tempo real 1 0,997 anos 4 3,81 30 12,5 100 14,7 1.000 15,6 10.000 15,7 infinito 15,71 Observe que pela natureza da fórmula, o limite máximo do tempo no espaço riemanniano tem sua definição, e mesmo quando o raio da curvatura é modificado através de novas descobertas, ele nunca fica muito grande. Conclusão: Parece que a luz pode tomar um "atalho" ao viajar através do espaço profundo, e mesmo quando assumimos por certo que as distâncias uniformitarianas são válidas, o tempo que a luz leva para chegar aqui, vinda dos extremos do universo, seria de apenas 15 anos. 3) Talvez a velocidade da luz fosse consideravelmente maior no passado. Há diferentes considerações sobre esta teoria. Uma sugere que a velocidade da luz tem diminuído consideravelmente nos últimos 300 anos, o que extrapola para uma velocidade 5xl011 (500 bilhões) vezes mais rápida 6.000 anos atrás.3 Se isso for verdade, a luz vinda de uma estrela a 5 bilhões de anos-luz (presumindo que as distâncias realmente são tão grandes) teria nos alcançado em 3 dias! Outra sugestão é de que a velocidade da luz, no tempo da Criação era infinita, e que uma "onda de choque" saiu da terra no momento da Maldição, diminuindo a velocidade da luz até o seu presente valor.4 A luz atualmente emitida dessas estrelas distantes, levaria muito tempo para nos alcançar, mas no tempo da criação ela teria chegado aqui quase instantaneamente. Ainda uma outra sugestão, é a de que a tolerância e a permeabilidade do espaço livre alterou-se por ocasião do Dilúvio diminuindo a velocidade da luz por um fator de 513 do seu valor anterior.5 Conclusão: Os criacionistas diferem em suas interpretações de como, quando e através de que fator a velocidade da luz foi alterada no passado, mas parece que há certa concordância de que é uma real possibilidade. Este terceiro fator pode ser usado independentemente ou em conjunto com os dois primeiros pontos. Em outras palavras, talvez, além das distâncias menores do que ordinariamente se reivindica, também seja verdade, ao mesmo tempo que a luz que viajava mais rapidamente no passado e que também tomasse "atalhos"! 4) Há indicações de que a terra e o universo foram criados com aparência de maturidade. Temos diversos exemplos disso: As plantas (Gn. 1:11-12) - Elas foram criadas adultas e deram fruto no momento de sua criação. O que teria levado anos para realizar-se através dos processos uniformitarianos aconteceu em segundos. Os animais (Gn. t;2~25) - Os peixes, as aves e as três categorias de animais terrestres foram criados adultos, tendo tal aparência e imediatamente eram capazes de se reproduzirem no primeiro dia de sua existência (v.22). A Bíblia, portanto, nos ajuda assim a responder a pergunta que não teria resposta: "O que apareceu primeiro o ovo ou a galinha?" Os evolucionistas tomariam o caminho infinito de volta às primeiras formas de vida mas o criacionista pode dizer que a galinha foi criada primeiro e então ela passou a pôr ovos. O Homem (Gn. 2:7) - Adão foi criado adulto, com um depósito inerente de conhecimentos e um vocabulário. Foi capaz do articular a linguagem e reproduzir-se no primeiro dia de sua existência (Gn. 1:28-29; 2:8,l6-20,24). Se Adão tinha a aparência de 20 ou 50 anos do idade é irrelevante; se uma pessoa entrasse no Jardim do Éden cinco minutos depois da criação de Adão, seria capaz de conversar com ele inteligentemente e provavelmente concluiria sob as pressuposições uniformitarianas, que Adão estava lá há muitos anos. Eva (Gn. 2:21-23) - Da mesma forma, Eva foi criada adulta e pronta para casar-se com Adão imediatamente. (Gn. 1:27-28; 2:22-25). As Estrelas (Gn 1:14-19) - O sol, a lua e as estrelas foram criadas no quarto dia da semana da criação. Individual e coletivamente elas deviam ter diferentes funções: separar o dia da noite, servir de ajuda à navegação. Como indicadoras cronológicas, para iluminar a terra, além de declarar a glória de Deus (Salmo 19:1). O que não se nota com tanta freqüência é que isso aconteceu no dia de sua criação (Gn. l:l5). É verdade que a palavra Bíblica estrela (Heb. Kökab; Grego: Astër) é um termo mais amplo do que a nossa palavra "estrela", fonte de energia, e inclui qualquer coisa no espaço. mas o que queremos destacar é que as estrelas (e a mais próxima fica a 41/2 anos-luz de distância) foram vistas no primeiro dia de sua existência. Isto significa que mesmo se as distâncias forem corretas, as estrelas simplesmente teriam dado a aparência de ali estarem há mais tempo. Portanto, as estrelas e os raios de luz que as ligam visualmente à Terra foram criados ao mesmo tempo. Este conceito dá lugar a diversas perguntas. Primeira. Isto não significa que Deus, como um mágico, está intencionalmente enganando-nos e fazendo as coisas parecerem mais antigas do que realmente são? A pergunta realmente retrocede à questão da intenção: será que Deus teve a intenção de tornar as coisas plenamente funcionais, ou será que nós nos sentimos enganados apenas porque as consideramos através de certas pressuposições uniformitarianas? Portanto, embora seja verdade que a terra e o universo foram criados com aparência atual, acho melhor falar da criação como um universo plenamente funcional que, como um aspecto secundário, apenas dá impressão de maturidade. A esta altura são geralmente feitas duas perguntas: "As árvores foram criadas com anéis anulares"? e "Adão tinha umbigo"? Primeiro, a pergunta acerca dos anéis anulares das árvores depende parcialmente do propósito para o qual Deus originalmente criou essas camadas. Temos observado este fenômeno e temos notado uma relação entre o número de anéis e a idade da árvore, mas a cronologia talvez seja uma função secundária das camadas, conforme se verifica em certas árvores que criam diversas camadas em um só ano, ou nenhum, dependendo das condições climáticas. Outra possibilidade é que Deus tenha acelerado o processo atual, de forma que Ele fez em segundos o que normalmente levaria anos para acontecer. Se as árvores tinham camadas ou não, não devemos ignorar o fato de que elas eram realmente árvores adultas que deram frutos antes do final do dia (Gn 1:11.12). Agora, a outra: Adão tinha umbigo? Provavelmente não, apenas porque o umbigo é um remanescente do processo normal de nascimento, e não de maturidade, de funcionalidade. Portanto, se Deus o criasse com um umbigo, isso realmente seria mentira, porque transmitiria uma informação errada. O conceito Bíblico de uma criação em funcionamento, com matéria que dava aparência de maturidade pode ser também estendida ao Novo Testamento. A criação do vinho em João 2:l-l0 é um exemplo. O fato de que água não foi criada ex nihilo, mas já existia, é irrelevante. O vinho é quimicamente mais complexo do que água, e por isso envolve uma certa quantidade de criação ex nihilo e além disso deu a impressão de ser vinho antigo (João 2:8-10). Assim também aconteceu com a criação dos pães e dos peixes, em João 6:l-l3. Normalmente, os pães e os peixes foram criados com aparência de maturidade, não porque Jesus estivesse realizando uma mágica de salão e tentasse enganar a Sua platéia, mas porque Ele quis que a matéria em questão fosse funcional e imediatamente utilizável. Conclusão Existem três possibilidades "seculares" ou não-Bíblicas quanto ao problema da harmonização de um universo jovem com as, supostamente, grandes distâncias das galáxias do espaço cósmico: as distâncias talvez não sejam tão grandes afinal, a luz pode tomar um atalho na sua viagem através do espaço sideral, a velocidade da luz talvez fosse consideravelmente maior no passado. Estas três possibilidades não são mutuamente exclusivas, e podem realmente ser usadas conjuntamente. A quarta solução, que pode ser usada independentemente ou em conjunto com as três acima, é que Deus criou os raios de luz e também as estrelas de modo que fossem, como realmente foram, visíveis no quarto dia da semana da criação. REFERÊNCIAS 1. Muitas pressuposições astronômicas são como um castelo de cartas. Por exemplo, a constante astronômica de Hubble, um ponto de referência nos cálculos uniformitarianos de distância, recentemente foi determinada ser consideravelmente diferente do que se pensava antes, resultando assim no "colapso" da noite para o dia do tamanho do universo em 50% do seu valor antigo. 2. Harold S. Slusher, "Travelling of Light in Space" ( Viagem da Luz no Espaço), em Age of the Cosmos (Idade do Cosmos), ( San Diego, CA, EUA; ICR 1980), págs. 25-37. Para analisar um outro ponto de vista sobre a geometria hiperbólica ou não euclideana do espaço, veja Mayne M. Zage, "The Geometry of Binocular Visual Space" ( A Geometria da Espaço Visual Binocular) Mathematics Magazine 53 (Nov. 1980), págs. 289-293. 3. Barry Setterfield "The Velocity of Light and the Age of the Universe" ( A Velocidade da Luz e a Idade do Universo), Ex Nihilo (1982); págs 52-93. 4. David. M. Harris, "A Solution to Seeing Stars"(Uma Solução para Observar Estrelas), Creation Research Society Quarterly 15 (Set. 1978); págs. 112-115. Ele oferece também uma explicação para o Desvio Para o Vermelho, que não exige um universo em expansão. 5. Glenn R. Morton, "Electromagnetics and the Appearance of Age" (Eletromagnetismo e a Aparência de Idade), Creation Research Society Quarterly 18 (Mar. 1982); págs. 227-232. P.S. da Sociedade Origem e Destino, abril 1999, por Waldemar Janzen. Experiências recentes tem produzido velocidades de ondas eletromagnéticas superiores à da velocidade da luz em até em torno de 4 vezes. Pressupõe-se, baseado nesta experiência, que velocidades quase infinitas são tangíveis. Um cientista brasileiro está na equipe de conceituação matemática do fenômeno. Por outro lado, há apenas uns meses atrás se noticiou que a luz pôde ser "freada" para se propagar com uma velocidade de apenas 60 km/s. Com isto, grande parte da relatividade de Einstein, inclusive a fórmula de relação entre energia e matéria, caem por terra. Isto prova que o teor deste artigo, apesar de ter sido escrito antes destas descobertas, é bastante atual. | ||||||||||||||||||||
|
This page has been visited times. |